Eu bem que podia. Podia sim. Podia ter te ligado outro dia
chamando pra ir ao show da banda que tocou no dia em que a gente se conheceu.
Podia ter te contado que encontrei com um amigo seu na rua e que a gente falou
de você, escondendo que fui eu que perguntei como vocês tinham se conhecido.
Poderia te ligar perguntando o que você vai fazer hoje, num tom indiferente,
quando, na verdade, estou implorando por dentro que você me chame pra sair. Podia mandar uma mensagem toda vez que passasse
perto da sua casa, porque aí quem sabe você não pede pra eu fazer uma visitinha?
E a vontade que dá de te avisar toda vez que eu to na praia? Porque você mora
tão pertinho da orla, de repente podia aparecer por ali, sem camisa, carregando
sua cadeira, fazendo aquela cara enrugada, forçando os olhos, de como quem diz
que o sol tá forte. Podia fazer tudo isso, mas sejamos francos:
De que adiantaria?
Só iria me proporcionar uma sensação prazerosa de “como foi
bom” que duraria por, no máximo, uns dois dias. Só iria me satisfazer por uma
noite e no dia seguinte eu ia ficar esperando, como uma otária, por uma ligação
ou mensagem que fosse. Aí eu teria que fazer o papel de homem, vulgo garotinha
apaixonada, que liga no dia seguinte. E ia ficar com aquela noite na cabeça
pelo resto da semana com um gostinho de “quero mais”. O que me faria ficar
esperando você notar que eu parei de puxar assunto, que já era a sua vez de
perguntar “qual é a boa”, apesar de que eu acho que você já notou e só não quer
continuar. Quem sabe daqui a um mês você não me procura como foi da outra vez?
Não sei se essa fase de revolta, que tem por sinônimo “fase
do foda-se” vai durar. Se bem que eu já fiquei bêbada várias vezes e nem te
liguei né? Ponto pra mim!
Mas, na verdade, acho que eu to começando a me tocar, como
eu já comecei a me tocar tantas vezes. Como uma vez que um menino pediu meu
telefone e eu disse que não daria. Fui sincera e disse que seria inútil, que
ele não ia me ligar e nunca mais nos veríamos. Nossa, fiquei tão orgulhosa de
mim. Então por que será que depois eu dei meu telefone pra tantos outros que
nunca mais veria? Acho que é a esperança que parece que morre, mas fica nesse
estilo bate e volta.
Mas sabe que eu até to feliz? Feliz de estar sem você, feliz
de estar sem ninguém, feliz de não ter nenhum casinho que eu sei que não vai
durar. Acho que eu cansei, assim como cansei tantas outras vezes e comecei um
rolo com um menino, depois mais um e quando fui ver estava cercada por mil
casinhos, toda animada. Porque eu gosto da conquista. Gosto da tensão de ver
que você está lá, desejando que você venha falar comigo. Gosto de passar pelos lugares que você
frequenta pensando em possivelmente te encontrar. Gosto e gosto muito. Gosto e
depois desgosto, gosto e depois enjoo. Assim como eu enjoo de tudo, assim como
eu canso de tudo.
Sigo tentando me controlar, tentando não falar. Até que eu
desista de desistir e volte atrás, volte a lutar e tentar ganhar nesse jogo que
eu jogo sozinha. Nesse jogo que eu sempre perco. Esse jogo que você nem sabe
que existe, esse jogo que você nem precisa saber ou jogar pra ganhar, pra me
vencer, pra me ganhar.
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